Alguns Pensamentos...

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segunda-feira, outubro 30, 2006

A marca da economia

Depois de uma comunicação desastrada sobre o preço da electricidade, o Ministério da Economia veio resolver o problema decretando que, em vez de 15,7%, a tarifa só aumentará 5,9%.
Aos consumidores agradecidos resta uma pergunta: se o Governo pode passar de 15 para 6, por que não passou para um valor mais baixo, mais perto dos aumentos de salários que concedeu? Por outro lado, se o Governo nada tem a ver com as tarifas da electricidade, por que lhes mexeu?
Deste modo, nem a primeira justificação – a do mercado – prevalece, nem a segunda – a da intervenção governamental – agrada. O ministério da Economia parece ser perito neste tipo de mal-entendidos. De certo modo, já é a sua imagem de marca.

quarta-feira, outubro 25, 2006

Ser pessoa excede o ser cidadão

A semana passada gerou-se, entre um grupo de amigos com uma formação variada, uma discussão em torno da tese do pedagogo da primeira metade do século XX, Kerschensteriner, segundo a qual o fim geral da educação é formar cidadãos úteis.
A minha posição relativamente a esta tese não ficou esclarecida na altura e aproveito para o fazer agora num post dirigido especialmente "à malta" que participou nesse curto debate, aliás, bastante interessante. Julgo que terá transparecido, para alguns espíritos menos atentos, que eu me limitei a afirmar como absurda a tese, arriscando-me a ser considerado como alguém com a «mania da contradição». «Então não é essa uma finalidade que define a própria educação? Não é totalmente justificável pôr o acento na formação para a cidadania?» - perguntaram alguns. Para a tranquilidade de todos presentes naquela conversa, sublinho sem reservas que a formação para a cidadania é um encargo humano irrecusável e muito importante, não sendo um absurdo ou um desperdício de energias, antes pelo contrário, reflectirmos sobre o seu significado, sobre os seus requisitos e sobre as suas implicações. Foi isto, aliás, o que me propus fazer naquele curto espaço de tempo, considerando, no entanto, que o não podia fazer adequadamente sem ter como pano de fundo o seguinte: a realização de cada pessoa passa de maneira forçosa pelo seu desempenho, nos múltiplos contextos da vida comunitária, como cidadão, mas é inaceitável que cada um seja reduzido à sua condição, não obstante muitíssimo nobre, de cidadão. Noutras e em menor número de palavras: ser cidadão é indispensável ao ser pessoa, contudo a pessoa que se é, sob a forma de "ir sendo", excede sempre o que ela pode e deve traduzir em termos de cidadania.
É a maior extensão do conceito de pessoa relativamente à do conceito de cidadão o que torna absurdo definir o todo da educação como formação para a cidadania. No entanto, porque não me parece possível a nossa construção pessoal íntegra sem exercitar e dilatar as capacidades para a intervenção na vida pública e mesmo política, a educação tem como uma das suas finalidades - a meu ver não é a sua finalidade última, a que a verdadeiramente a caracteriza, antes uma finalidade que se cumpre em práticas instrumentais - a formação para a cidadania.
Não admira, portanto, que frequentemente apareçam confundidos o enunciado dos propósitos do desenvolvimento pessoal e o enunciado dos propósitos do desenvolvimento social (ou cívico). Lida num sentido restrito, a confusão parece-me legítima. De facto, somos como cidadãos o que somos como pessoas. Por isso, e seguindo o mesmo sentido, poderíamos até falar apenas na formação da pessoa.
Ser pessoa implica ser o indivíduo à parte que cada um é, e a ilegitimidade da confusão só se pode encontrar se, como o fito exclusivo na cidadania, se esmagar a individualidade de que somos socialmente chamados a dar conta dos nossos actos. Estes adoptam, na sua quase totalidade, uma faceta pública, uma realização que, pelo menos em alguns dos seus efeitos, se exterioriza, mas não podem prescindir na sua origem de um centro pessoal intransferível e, nesta acepção, profundamente individual.
Objectar-me-ão que estamos a cair num círculo, dado que nem sequer o indivíduo é por completo inato, indo ao longo da existência integrando lições retiradas do convívio, de raio variado, sem o qual o ser da nossa espécie não se pode tornar propriamente humano. Isto é correcto, todavia não configura uma objecção, pois não defendo (jamais) que o nosso ser individual seja separável do nosso ser social; o que digo, ao invés, é que um e o outro são faces da mesma moeda, do nosso ser pessoal.
Em suma, mais do que cidadãos, somos pessoas e que, enquanto pessoas, traduzimos socialmente o indivíduo que somos e transformamos em sociedade certas idiossincrasias particularistas.
Porém, esta minha posição, em que julgo que as principais linhas de força ficaram esclarecidas, sobre o que somos e o que queremos com a nossa formação exigem uma certa «ginástica», que nos permita mover, entre afirmações n vezes repetidas e tidas como indiscutíveis com um espírito crítico, o que se espera, afinal, de qualquer verdadeiro cidadão.

sexta-feira, outubro 20, 2006

O sentido do destino

«O que verdadeiramente se passa não é que as coisas aconteçam a cada um segundo determinado destino, mas que cada um interpreta as coisas que lhe aconteceram, se tem capacidade para tal, dispondo-as em determinado sentido - o que significa, segundo determinado destino.»
Cesare Pavese, in O Ofício de Viver

quarta-feira, outubro 18, 2006

É necessário explicar

Uma proposta do Ministro da Saúde provocou naturais ondas de choque na sociedade: a introdução do pagamento de taxas nos internamentos hospitalares.
Antes de cada um se posicionar perante uma proposta tão estranha – ninguém é internado porque quer – seria necessário compreender o alcance da medida, para lá dos motivos meramente económicos. Se é verdade que Correia de Campos já poupou milhões de euros no seu Orçamento, é certo que também nos leva grande parte do nosso: os portugueses estão entre os europeus que mais contribuem para a Saúde. Por isso, é natural que nos informem: o modelo deste ministro é o actual Serviço Nacional de Saúde, com remendos que vamos pagando em medidas pontuais, ou é outro? Não se trata de criticar medidas avulsas, que até podem fazer sentido. Trata-se de compreender para onde vamos, que modelo queremos seguir, enfim, onde queremos chegar para – então sim – cada um fazer as suas opções.
O mesmo se poderia dizer, aliás, de outros sectores, sobretudo da Educação. Ao contrário do que se passa na Administração Pública e na Segurança Social, onde o ponto de chegada parece relativamente claro – concorde-se ou não com ele –, na Saúde e na Educação o objectivo final das pequenas e grandes mudanças introduzidas por este Governo permanece obscuro.
Ora, uma reforma cujo objectivo não é explícito torna-se incompreensível e a prazo é potencialmente explosiva. Talvez isso explique, aliás, a surpresa da ministra da Educação com a grandiosidade do protesto dos professores.
Não basta dizer que as reformas irão até ao fim. É necessário explicar que reformas e quais os seus objectivos e modelos exactos.

terça-feira, outubro 17, 2006

A face do silêncio: para quando a mudança?

Anna Politkovskaia (1958-2006), uma voz crítica do regime autocrático russo – encapuçadamente democrático, porque é isso que o Ocidente quer crer – de Putin, apareceu morta a tiro no elevador do seu prédio. Anna, uma missionária do jornalismo de investigação, incómodo e impertinente, preparava um artigo sobre as sevícias que se praticavam, em nome da justiça, da liberdade e da integridade territorial, na Tchetchénia. Uma vez mais, uma jornalista foi brutalmente silenciada na Rússia. Neste momento, que saiba, as autoridades policiais avançam três versões do crime:
A primeira poderá estar ligada ao processo dos "polícias de Nijnevartovsk". Em 2001, esses agentes, durante uma missão de serviço na Tchetchénia, raptaram, torturam e mataram numerosos civis. Graças ao trabalho de investigação e publicações de Politkovskaia, o processo foi a tribunal e os culpados foram condenados a pesadas penas de prisão. Um deles, Serguei Lapin, tinha ameaçado várias vezes a jornalista.
Segundo a versão seguinte, o crime poderia ter sido organizado por políticos da oposição a Vladimir Putin com vista a comprometê-lo a ele a a Ramzan Kadirov, primeiro-ministro do Governo tchetcheno pró-russo, para os desacreditar aos olhos do Ocidente. Aponta-se o nome de Boris Berezovski, magnata russo de origem judaica que encontrou refúgio político em Londres. A terceira versão aponta a organização do crime para Ramzan Kadirov, figura duramente criticada pela jornalista russa.
Além disso, surgiu mais uma versão, a quarta. Segundo esta, Politkovskaia poderia ter sido assassinada por grupos fascistas e nacionalistas russos. O seu nome figurava numa lista de personalidades a abater, que foi colocada na Internet por grupos radicais russos.
Em casos anteriores de assassinatos de figuras públicas russas, os dirigentes do país também prometeram encontrar os criminosos, mas sem grande sucesso... ou vontade?

segunda-feira, outubro 16, 2006

O cúmulo na justiça!



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sábado, outubro 14, 2006

Hoje, 10h00



É hoje. É nestas alturas que qualquer investigador pensa «porquê?... com tanta profissão jeitosa...»
Não é receio. Não são nervos. É tudo. Um cocktail atestado de tudo o que contrai músculos e que assim os deixa. Toda uma comunicação preparada que fazia sentido na minha cabeça, hoje aparece com parágrafos trocados. Bastante cansado, que ajuda sempre um bocadinho, olho uma última vez para a comunicação. Tenho de ir, ainda há uma estrada para fazer e um carro para estacionar. Hoje às 10h00, estreia-se mais um receio. Hoje, às 10h00, cresci como investigador.

quinta-feira, outubro 12, 2006

Nobel da Literatura



Orhan Pamuk, um escritor pouco querido dos nacionalistas turcos devido ao seu apoio às causas arménias e curda foi galardoado com o Prémio Nobel da Literatura de 2006.
Pamuk, segundo a Academia Sueca, terá ganho o título devido ao seu empenho na denúncia literária daquelas causas e das tensões entre o Ocidente e o Oriente através da sua constante «busca pela alma melancólica da sua cidade» que lhe terá permitido descobrir «novos símbolos para o confronto e o cruzar de culturas». Orhan Pamuk tem dois livros editados em português: A Cidadela Branca e Os Jardins da Memória, ambos com a chancela da Editorial Presença.

quarta-feira, outubro 11, 2006

Divisão na península asiática

A Coreia do Norte disparou o seu ensaio nuclear no mesmo dia em que a Coreia do Sul conseguiu eleger o novo Secretário-Geral da ONU.
A gestão desta crise atómica irá, ou não, aprofundar a divisão daquela península asiática ou o Pacífico, tão próximo, é o alvo?

segunda-feira, outubro 09, 2006

O sector das telecomunicações

Parece-me que os remédios que a Autoridade da Concorrência decidiu impor à Sonaecom para autorizar que esta compre a PT possam ser lidos desta maneira: Abel Mateus, presidente da Autoridade, considera que muita coisa estava mal em matéria de concorrência no sector das telecomunicações, ou seja, que a PT se comportava no mercado de forma monopolista. Ao dizer isto, Abel Mateus passa um atestado de incompetência à Anacom, entidade de supervisão das comunicações, e – do mesmo modo – passa à própria instituição que dirige atestado idêntico.
Na verdade, se tanta coisa estava mal no sector, por que nada fez a Autoridade da Concorrência para alterar o panorama agora descrito? E se a OPA acabar por não ir em frente, como pensa a Autoridade da Concorrência corrigir tudo o que agora veio dizer que está mal?
Seja qual for a resposta da Autoridade, nada ficará como antes no sector das telecomunicações em Portugal.

sexta-feira, outubro 06, 2006

«Estou pronto a morrer pela Liberdade!»



Humberto da Silva Delgado (1906-1965) corporizou o principal movimento de tentativa de derrube da ditadura salazarista através de eleições.

quinta-feira, outubro 05, 2006

O apelo do dia



quarta-feira, outubro 04, 2006

Poetizar

Se o poeta é um fingidor, finge tão completamente que chega a fingir que é dor a deveras sente; isso faz do poeta um hipócrita? Não, claro que não, um poeta não pode, nunca, ser hipócrita; a sua condição impede-o. Esta foi a resposta, imediata, que dei numa rápida conversa de esplanada. Foi Fernando Pessoa que escreveu, não foi, perguntaram, Foi, respondi. A acompanhar o delicioso e espontâneo debate, Manuel Freire cantava, Eles não sabem nem sonham que o sonho comanda a vida… – Pedra Filosofal, poema da autoria de António Gedeão.
Mas porque razão finge o poeta e porque finge o homem, a dor? Confesso que não sei; e talvez, mesmo correndo o risco de “blasfémia”, não concorde inteiramente com Pessoa. Não, enquanto poeta que não sou, mas sim, enquanto Homem que julgo ser. E no entanto a frase – se transcrita em prosa – ou a quadra – disposição em verso –, é de uma profundidade tamanha que nos obriga a pensar. Será que o poeta só consegue afirmar-se e cativar a audiência, quando transmite dor, dó e infelicidade? Será que o poeta não tem o direito de ser uma “pessoa normal”, sem desamores nem paixões proibidas, nem desgraças nem lágrimas derramadas nas pedras da calçada? O poeta é tão-somente, pessoa, ainda que Pessoa o caracterize de forma diferente; como fingidor dorido ou como fingidor fingido.
Ainda não percebi bem o que é ser poeta; tal como não compreendo o que é a boa e a má poesia. Sei que ser poeta é ser diferente; mas não uma diferença, necessariamente vagabunda, boémia ou marginal; nem, também, uma diferença necessariamente famosa, aristocrática, premiada e coroada de “Ámen”, apenas porque todos os outros dizem sim senhor.
A poesia, entendo eu, é uma forma de embelezamento do pensamento pensado e transcrito: nada mais do que isso! Aquilo que o poeta diz, escreve ou fala, são sensações que apenas para si, conferem verdadeiro significado, sendo irrelevante ou inadequada, qualquer forma ou tentativa de interpretação do seu pensamento – meras atitudes falsamente dogmáticas que se destinam ao fabrico de inverdades.
O poeta é um fingidor, É, Finge completamente, Finge, Sente dor, Sente! Mas no fundo, todos somos tudo isso: doridos, fingidores, fingidos e, porque não, poetas – para ser poeta basta viver e sentir enquanto tal, sabendo que esse sentir e esse tal, são aspectos que nenhum dos outros – de nós – tem o direito de definir. É por isso que julgo ridículo e puramente delirante, o facto dos “sábios” imporem aos comuns regras de interpretação e de significância acerca dos escritos que nos legaram. Mais ridículo ainda, é classificar a poesia como boa ou má, muita vezes – a maioria – tendo apenas por base o nome que figura no fim do texto: se nome da praça pública, todos batem palmas de contentes e abrem desmesuradamente os olhos perante os versos elaborados; se “sem nome” ou nome “anónimo”, todos permanecem indiferentes, rindo muitas vezes, escarnecendo, até, das linhas escrevinhadas. Eis aqui, também, os fingidores, e estes nem sequer sentem a dor ou fingem que são doridos.
A poesia vale aquilo que a entendermos como tal; assim como o autor que a poetizou; Não há – não devia haver – lugar a qualquer eleição de pódio – classificar a poesia ou impor-lhe interpretações, é um mero exercício retórico, pleno de afirmações convenientes.
Manuel Freire entoava, Sempre que o homem sonha, o mundo pula e avança… e aqui não há qualquer tipo de hipocrisia nem de fingimento da dor sentida.
O Sonho comanda a vida... saibamos sonhá-la, vivê-la e poetizá-la!